Permita-se não saber!


Eu tenho saberes sobre muitas coisas, e em diferentes áreas do conhecimento. Tive uma formação rica e generalista, e também tive a sorte de estudar e trabalhar com verdadeiros gênios, pessoas que me inspiraram muito. Mesmo não conhecendo algumas coisas tão profundamente, por assim dizer, eu sei de tudo um pouco, e aprendo fácil por mim mesma também. Durante minha trajetória profissional, mudei muito de área, criei muito, e era comum eu ser reconhecida como “especialista” em determinado assunto pouco tempo depois de estar trabalhando naquilo. Fui especialista em muita coisa nessa vida, tantas que nem lembro mais. Sabe aquela música do Kid Abelha? Tipo isso.
Atualmente estou aposentada, e posso dizer que, apesar de não ter tido uma grande projeção no mercado de trabalho, estou bastante satisfeita com a forma como concluí minha carreira: produzindo bastante, com muita parceria com meus superiores, e com conforto e liberdade para trabalhar em meus projetos. #Sougrata!
Mas o que eu tenho de melhor dessa experiência de mais de 30 anos, em que trabalhei em quase 20 setores diferentes é o aprendizado mesmo. Um aprendizado que me é útil de muitas formas: nos meus assuntos familiares, nos meus assuntos pessoais, no meu processo de autoconhecimento e até no meu lazer (viagens, por exemplo). E eu percebo que a razão dessa facilidade que sempre tive para aprender é somente uma: a disposição em não saber. Eu sempre tive isso de duvidar de mim mesma e de olhar as coisas com um olhar o mais neutro possível, de ser um receptáculo mesmo! Acredito que essa é uma característica do meu feminino, uma parte curada dele. 
Não que eu ache que não devamos considerar o que sabemos, ao contrário: penso que todos temos os nossos saberes e o direito de compartilhá-los. Mas considero importante essa atitude de se permitir receber informações do outro de maneira isenta. 
Porque quando a gente não se permite duvidar de nós mesmos, temos sempre uma opinião sobre as coisas e as pessoas carregada de conteúdo pessoal. É sempre um saber sobre o que, de fato, não sabemos. 
A conhecida fábula chinesa em que o mestre, percebendo a dificuldade de assimilação do discípulo, o convida para tomar chá, e pede que esse encha a sua xícara inclusive depois de ela já estar cheia, e continuar até transbordar. Se a nossa xícara está transbordando, o melhor que podemos fazer é esvaziá-la antes de querer colocar mais chá nela. Esvaziar a mente, o ego, os saberes, as opiniões. Esvaziar o orgulho e o julgamento de achar que o outro, por alguma razão (que geralmente só existe na nossa cabeça) não tenha o que nos ensinar. Esvaziar a ideia de que conhecemos o outro e sabemos tudo o que se passa com ele — uma ideia geralmente baseada numa visão limitada ou ultrapassada que temos das pessoas. O ser humano está constantemente evoluindo e é preciso estar aberto ao fato de que as pessoas não ficam paradas na imagem que fazemos delas em nossa mente.
Mesmo que eu não concorde com as posições de determinada pessoa, se me permito acessar o que ela tem a dizer, posso aprender coisas que em minha vida, por melhor e mais rica que eu julgue ser, não tive a oportunidade de vivenciar, ou mesmo posso me permitir rever em algum grau minhas opiniões, evoluir como ser humano.
Ser assim já me ajudou muito nessa vida e quando eu entro no piloto automático e vou me perdendo de mim, procuro logo meu jeito de me lembrar de esvaziar. Como? Eu continuo recomendando o que tem feito toda diferença em pra mim diariamente: meditar!

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